Texto de Jarbas Souza
Estaria havendo alguma renovação no reinado de momo?
Vinha
observando com tristeza, a cada ano que se passava menos euforia e
efervescência nas pessoas que saíam às ruas com destino aos focos de animação
carnavalesca.
Este
ano me rejuvenesci no vai e vem das orquestras de frevo e os rufares dos
tambores dos blocos, no Recife Antigo, me reportei aos anos 50/60, quando na
minha juventude, vivenciei a euforia e a irreverência dos saudosos carnavais.
Naqueles
tempos, podiam-se ver duas semanas antes de Zé Pereira anunciar a abertura da
festa mais popular de nossa cidade, uma animação contagiante. Os bailes
carnavalescos nos principais clubes, as troças de rua, os caboclos de lanças,
os “papangus”, “a La ursa” e as peladas na pequena campina onde todos jogavam
bola vestidos com saias, por conta do carnaval.
A abertura do corso logo cedo pela manhã, cuja
brincadeira sobre os carros, sem os escapes com suas capotas arriadas ou
serradas, provocava um infernal barulho animando mais as brincadeiras com água,
talco, confetes, serpentinas e lança-perfumes.
Por volta das cinco horas da tarde a brincadeira com água
dava lugar aos carros com foliões fantasiados, bem como as alegorias que
percorriam as ruas numa animação que se perdeu no tempo, com a modernidade
globalizada, cuja insegurança e a falta de educação de alguns que extrapolaram
os limites, confundindo água com sujeira, detritos e outros, contribuíram para
a extinção desse tipo de manifestação, ate porque, o barulho dos carros foi ficando
inoportuno em razão das áreas consideradas de silencio, pois os sons
ultrapassavam os limites auditivos.
E lá, estava eu e toda rapaziada de quem guardo saudosas
lembranças, arruando, nas principais ruas de St. Antonio e Boa Vista, atrás das
agremiações, assim como no bairro dos Aflitos,onde morei por cerca de 20 anos, como
uma criança correndo em busca do imaginário.
Assim, foi a cada ano que se passava, assistia o renovar
das brincadeiras e das fantasias que as pessoas tinham o orgulho e a vaidade de
mostrarem, pois era um tempo em que, havia sim, uma violência aqui e ali, mas,
não tão desenfreada como mos tempos atuais. Era mais uma briga por causa de uma
seringada de lança-perfume inadequada e imprópria, e ai aqueles machistas não
suportando a irreverência carnavalesca, a essas alturas, com a cabeça cheia de
bebida e o porre de lança, esquentavam, indo as vias de fatos, que logo a turma
do “deixa disso” entrava para separar.
Podíamos ver foliões deitados nos finais dos bailes, com
o dia amanhecendo, uns a descansar e outros cuja embriagues do frevo, se
entregava a “Morpheus”. Assim era o carnaval, na metade do século 20, violência
quase zero comparada aos dias atuais, e se podia voltar para casa a pé ou de
ônibus, não havendo riscos, sobretudo, quando se estava acompanhado.
Nos clubes quando a orquestra começava a tocar – “Nelson
Ferreira Toca aquela introdução” – a moçada se esbaldava no salão, enquanto os
pais ficavam às mesas observando seus filhos, em particular suas filhas, pois a
vigilância era como se diz no futebol “marcação por homem”. A orquestra, quando
percebia alguma encrenca juvenil, rasgava aquele frevo de bloco ou um “Potpourri ou Pot-pourri” dos
hinos dos três clubes de futebol, sendo destaque do Sport quando se tratava da
Orquestra de Fernando Borges, a fim de abafar e acalmar os ânimos da juventude
pouco amadurecida.
A Rua Nova, Imperatriz, Imperador, Concórdia e outras,
são testemunhas dos milhares de foliões, que por lá se desdobraram no passo,
nas noites cujo glamour, ainda hoje, se pode ouvir o eco dos passos e o
cantarolar acompanhando as agremiações carnavalescas.
Com a restauração do Bairro do Recife, oportunizou-se o
resgate de uma das nossas culturas populares mais festejadas. Assim, a
sociedade pernambucana, pôde reviver os saudosos carnavais, agora tendo como
palco o marco zero, juntamente com todas as ruas adjacentes, em particular a
Rua do Bom Jesus, berço da 1ª sinagoga das Américas.
Arruando, expressão usada com muito sabor pelo médico e
historiador Rubem Franca, fui levado ao Recife
Antigo, num transportar no tempo, caí em um
espaço muito acolhedor, renovando as nossas tradições culturais, riquíssimas
pelas suas histórias de vida desde seu nascimento.
Mas,
sem conter a euforia do reinado de momo, senti na alma de bom pernambucano, a euforia
de muitos foliões em meio aquela multidão que ia e vinha, ao som da
musicalidade de nossas agremiações. No passado, bastava à orquestra ou outra
forma de ressoar as machas e frevos, para mexer com os nervos e músculos de
quem estivesse num raio de 100 metros. Lembro-me, como se fosse hoje, na Rua
Nova esquina com a Dantas Barreto, um folião com os cabelos tão grisalhos,
parecendo um capuchinho de algodão, fazendo um passo de fazer inveja a qualquer
dançarino do balé popular.
Gerada
a consciência de prioridade de nossas músicas carnavalescas, as agremiações empolgaram
toda aquela multidão presente - homens, mulheres,
jovens e idosos. Como se fossem todos os dias cantos do Galo, de madrugada a madrugada. O que é admirável, é que o pernambucano nunca perde sua identidade
carnavalesca. Com a renovação da musicalidade que ferva da cabeça aos pés, nossos ídolos da festa momesca, levaram ao
êxtase multidões, tornando nosso carnaval o melhor e maior do Brasil.
Na
verdade, para nós foliões recifenses: a apoteótica apresentação do Galo da Madrugada, que colocou no
Centro da Cidade Mauricéia, mais de um milhão de apaixonados pelo maior Clube de Máscaras do mundo - ainda bem: não podemos perder o pódio - os espetáculos que nossos artistas com Alceu Valença, Elba Ramalho, Claudionor
Germano, e outros, interpretaram as canções de nossos maiores compositores como
Capiba, Nelson Ferreira, Getúlio Cavalcanti, Luis Bandeira, Edgard Moraes e outros,
fazendo com que toda a área do Recife Antigo, se sacudisse ao som de sua
musicalidade. ESTAMOS, POIS, TODOS DE PARABÉNS POR CONTINUAR NO PÓDIO DO
CARNAVAL MAIS PARTICIPATIVO DO BRASIL, TENDO COMO MUSAS INSPIRADORAS OLINDA E
RECIFE.
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